Sinais de ordenamento e alinhamento (4)

Autor: Wilson Geraldo de Oliveira

Terráqueos – entre a supremacia branca e a diversidade étnica
Ilustração de Bárbara Coelho Oliveira

A relação da etnia branca versus toda uma diversidade étnica em nosso planeta é marcada historicamente, por relações de dominação. E é norteada por um modelo expansionista de exploração econômica, que pode ser conhecido a partir da história colonial. Lembro, como mencionado no primeiro texto desta série de postagens sobre “a ideia de raça” (A contribuição das ciências sociais para o tema OVNI/UFO) que não tenho aqui, nem a intenção e nem as condições ideais para explorar, com a profundidade que merece, as teorias que podem dar sustentação a alguns dos conceitos aqui utilizados. Essa é uma tarefa bem maior. Trata-se portanto, de uma reflexão provocativa para o pensar de todos nós.

Estou certo de que não sou o único que pensa que as relações de exploração do homem pelo homem são por si mesmas, impeditivas da construção de um sentimento de unidade civilizatória. Parece evidente que para alcançarmos oportunidades civilizatórias, haveremos de reconhecer a necessidade de redução das desigualdades sociais e econômicas. E  como sociedade humana  reafirmar os laços de solidariedade uns com os outros e não de dominação, além de desenvolver o respeito a diversidade da vida planetária.

O modelo econômico atual gerou contínuas e cumulativas desigualdades. Possibilitou a construção de disposições sociais hierárquicas entre tipos diferentes, porém de mesma origem planetária. Em razão desse constructo social histórico, os estudos raciais mostram a impossibilidade de uma unidade civilizatória, especialmente quando a ideia de superioridade de “raça” se torna supremacia de classe e parece perpetuar a dominação entre nós com a ambição da classe dominante de avançar para alhures, no cosmos.

Quando falamos de desigualdades econômicas, vale lembrar que elas são decorrentes das contradições presentes no modo de produção capitalista. O seu caráter predatório vai além do lucro e é parte constitutiva das relações de produção. Estamos falando de uma equação que não fecha. Estamos falando de um sistema econômico que ao explorar as fontes de energias e recursos naturais, não percebe ou não quer perceber que estas fontes são finitas. Que se não houver uma imposição de limites a esta exploração caminharemos para um ecocídio planetário; Um sistema que gera fartura para poucos e miséria para muitos; Um sistema que para causar alegria para alguns, por aumentar seus lucros e rendimentos de capital, muitas vezes improdutivo, leva a dor e sofrimento  a uma maioria socialmente desprotegida; Um sistema que faz do homem explorador e predador da  própria espécie. Lembremos  portanto, que é da natureza do sistema capitalista a ausência de limites. E também a sua capacidade de se reinventar sempre que questionado, reinventando as crises para um “novo” ciclo de produção e distribuição baseados na exploração do homem pelo homem.

Apesar de nos causar desconforto e dor, as relações de produção atuais passaram a existir com esta mesma sociedade da qual somos parte. Foi portanto, um sistema construído por nós, seja por nossas ações ou por nossas omissões e só poderá ser modificado por nós.

Todos nós, exploradores e explorados, ricos e pobres, sabemos, que temos um desafio pela frente. É nestes momentos difíceis, quando fica evidente as desigualdades,  que retomamos a tão sonhada ideia de revolução socialista. Citando Marx e Engels, Mészáros demonstra que desde a obra “A ideologia alemã” a revolução social já é definida em termos essencialmente internacionais: “Empiricamente, o comunismo só é possível como o ato dos povos dominantes ‘conjunta’ e simultaneamente, o que pressupõe o desenvolvimento universal das forças produtivas e o relacionamento mundial a elas vinculado.” (MARX; ENGELS apud MÉSZÁROS, 2011, p.1042)

Todo sonho de uma sociedade melhor deve buscar as bases materiais para sua realização. De outra forma caímos no messianismo, comum  em tempos de crise, especialmente como agora. Uma crise planetária, conjugada com a ideia salvacionista de uma intervenção de raças extraterrestres, que se supõe, nos acompanham diuturnamente. Haja visto a quantidade de supostos avistamentos de OVNI/UFO em tempos de pandemia do COVID19. O campo é bastante propício, isso no entanto, será assunto para outra momento,  sobre o papel dos surtos messiânicos.

É possível ouvir também, que vivemos hoje um desafio global, mais que dilemas locais: ou transformamos radicalmente as relações que impulsionam as forças produtivas do modo de produção capitalista, ou sucumbiremos com ele. Será? O capitalismo vive de crises. Não deverá ser difícil identificarmos uma situação de crise persistente e paralelamente a gestação de transformação no modo de produção global com mais um ciclo de capitalismo naturalmente predatório.

Localmente, ou nos estados nacionais, ou nas regiões e blocos de nações, ainda repetimos os velhos dilemas, sempre norteados pela chamada economia de mercado. O dilema entre fortalecermos nossa economia interna ou aliarmos à pseudo segurança do capitalismo global, sabidamente predatório. Sobre esse aspecto veja e.g. o artigo “Dilema e desafios postos para a sociedade brasileira” de Plinio Arruda Sampaio publicado no ano 2000. Observe como em muitos aspectos a situação se repete persistentemente.  (SAMPAIO, 2000).

Fonte: https://thoth3126.com.br/

Civilização Terrestre e a diversidade interplanetária
Ao considerarmos a nossa postura diante da categoria extraterrestre, veremos que em muitos casos, prevalecerá com muita força a ideia de superioridade desta. É comum admitir que exista um acompanhamento externo de nossa experiência na terra, por parte de civilizações extraterrestres. E que estas são superiores a nós em vários aspectos, embora não se possa ter ideia clara da natureza dessa superioridade e desse acompanhamento. São aspectos de uma relação, que podem ser expressos por vezes contraditoriamente, nas narrativas de contato entre terrestres(contatado) e extraterrestres(contatantes) como formas de perceber e pensar esta relação.

As narrativas representam a materialidade das relações. Se afirma que são relações no plano do cotidiano, mas isto, embora seja significativo, nesse momento é secundário. E provavelmente continuarão a sê-lo por mais algum tempo. Até que compreendamos melhor o que se passa. O mais importante é que podemos ou não acreditar em tais narrativas e continuar pensando tais relações; Que elas alimentam discussões e ideias; E principalmente, que elas influenciam comportamentos.

Se pensamos os extraterrestres como superiores, por óbvio, estamos nos colocando numa posição de inferioridade e subordinação ou até tutela a eles. À parte os novos contextos que poderão surgir, com extraterrestres em nosso cotidiano social. Esta ideia guarda uma semelhança com o modo de pensar à superioridade da “raça” branca pelos diversos grupos humanos, terrestres, racializados.

Estas relações “raciais” em nossa sociedade se traduzem por relações de subordinação e de classes. Muitos aspectos do comportamento de trabalhadores em relação aos patrões, como admiração, gratidão e até adoração, são incoerentes e contraditórias, face às condições degradantes sob as quais vivem e às relações de exploração econômica e de dominação à que estão submetidos certos grupos sociais.

Diversas etnias, indígenas sul-americanas p. ex., se vêm submetidas, desde o início do contato, ao predomínio do branco. Do ponto de vista econômico, equivale dizer que os brancos, por controlar os meios de produção submetem grupos étnicos à condição de fornecedores da força de trabalho. Mão de obra barata, péssimas condições de trabalho e subvalorização de recursos naturais fornecidos por eles nas relações de troca, etc.

No entanto, apesar disso,  a assimilação do índio ao mundo dos brancos possui o caráter da admiração devotada ao tecnicismo da sociedade envolvente que leva à partilha do poder do dominante sobre o dominado. Haja visto a assunção de várias funções de controle social do estado nacional, por indivíduos dos grupos indígenas em seus próprios territórios.

Alguém pode estar a pensar desde as primeiras postagens dessa sequência: Não é possível tal comparação; Os seres do espaço são  moralmente evoluídos; Haverá uma nova ética nas relações com seres do espaço exterior;  Os modos de produção e as relações de produção serão outras, etc…

E eu me pergunto mais uma vez: Não será isso mais um desejo que um fato? Não houve um salto do ano de 1500 até os dias de hoje. Do antigo mundo europeu ao novo mundo nas Américas. E nossos índios que aqui viviam aos milhões, como estão hoje? Será que agora teremos um salto ético e moral nas relações entre novos mundos? O que mudou nas relações?

Só mudou que, aqueles que chegam, chegam de outro planeta e não de outro continente. O que de fato nos possibilita imaginar que sua forma física, sua genética, seus valores, nível de evolução, relações e formas societais, etc., sejam diferentes. Mas, daí a afirmar que são  moralmente superiores, pode ter distâncias significativas. E as próprias narrativas não são unanimes em afirmar isso.

Lembrando que estamos, à nossa maneira,  alcançando outros planetas. Talvez de uma forma muito rudimentar em relação ao que se imagina para raças superiores chegando à terra. Podemos aplicar a nós, como disse antes, o que podem pensar alguns em relação aos seres do espaço exterior, na forma de questionamentos.  Quando não somos nós os anfitriões e quando nós é que estamos chegando a outros planetas: Nós, na condição de seres do espaço, seremos esperados como seres moralmente evoluídos? Haverá de fato, de nos acompanhar uma nova ética nas relações com seres do espaço exterior? Será diferente daquela forma com a qual tratamos nossos semelhantes?  Os modos de produção e as relações de produção serão outras?

Índios Tukúna – entre dois mundos
Estudos de fricção interétnica no Brasil, (Tukúna – Alto Solimões, entre outros) são reveladores de grandes transformações. É visível a força da cultura nativa tradicional de muitos grupos. Entretanto, as relações  de exploração, deixam marcas visíveis.

Entre a alternativa de seguirem os valores tradicionais de sua etnia, a manutenção de seus ritos, do sistema de parentesco, linhagens clânicas e casamentos, enfim, seguirem o seu modo de vida nativo, ou por outro lado, a alternativa de se empenharem no trabalho das frentes de expansão econômica da sociedade nacional, nos seringais da região do Alto Solimões.(década de 1960) Um modo de vida, que na origem  das relações de contato, podia representar apenas objeto de curiosidade para o nativo, algo totalmente novo, nunca visto, talvez, nem sonhado por algum xamã ou pajé em transe ritual.

Waura shaman in Brazil. Photo by Sue Wren.

Esse dilema entre um modo de vida e outro, lhes rendera qualificativos no mínimo, de “pouco produtivos”. i.e. Cuidar da própria cultura e identidade étnica ou trocar sua força de trabalho por utensílios e bens culturais do homem branco?

Em função de muitas vezes optarem pelas suas práticas e valores de sua etnia, eram preteridos em relação a outros grupos mais produtivos nos trabalhos dos seringais. Apesar da força de sua cultura, o tempo de exposição ao contato com as frentes de expansão através das empresas extrativistas, exerceu grande influência e destruição do modo de vida nativo.  (Cardoso de Oliveira, 1972).

É marcante o ordenamento das relações entre o homem branco terrestre e outros grupos étnicos (o negro, o índio, o caboclo, o judeu, o cigano, etc), como veremos adiante, relações marcadas por situações materiais objetivas, pelo expansionismo econômico que se consolidou a partir da sobreposição dos interesses do branco sobre os interesses dos demais grupos, cada um com suas circunstâncias históricas.

Nas frentes de expansão econômica de áreas indígenas no Brasil de meados do século XX, o “caboclismo” assim denominado por Cardoso de Oliveira é mais um exemplo destas marcas ideológicas. Forma extrema de alienação: a tendência de alguns índios de se enxergarem pela ótica do “branco” e aferirem, pelo comportamento destes, os seus padrões de excelência. O caboclo é um híbrido (para usarmos um termo caro para os estudos com abduzidos, nas relações terrestre/ extraterrestres) que não se adapta plenamente, nem de um lado, nem de outro das etnias ascendentes, constituintes de sua origem.

No caso Tukúna existe o “tuxawa”, normalmente um mestiço, cuja introdução como mediador, tradutor na relação entre brancos e índios fora feita pelo patrão seringalista. Tal figura exercia ocupação equivalente a de um capataz e produziu importantes mudanças no sistema político dos Ticuna. Em geral considerado, pela bibliografia etnológica, como um “instrumento utilizado para estabelecer a sujeição dos índios”.(Cardoso de Oliveira, 1972, p.91)

Criação de colônias nos planetas vizinhos

Kalpana One space settlement

De tal forma, a índole expansionista se mantém na perspectiva das elites econômicas de hoje, que pensam em ir além do planeta terra e com a mesma postura colonialista de sempre, criar colônias na lua, em marte e em quaisquer outros planetas que puderem receber a vida humana tal como a conhecemos. Considerando: 1) que a racialização (a ideia de que existe raças biológicas) e seu uso ideológico sustentou as relações econômicas do atual modo de produção; 2) que a ideia de classe que nasce concomitante com a ideia de raça, e guardando equivalência funcional entre elas, ainda sustenta um processo de acumulação de capital; e 3) que este processo predatório é o que tem viabilizado tais projetos expansionistas; Perguntemos: quem será a força de trabalho nas frentes de expansão para o espaço exterior? Como serão as relações de produção? E mais: Tal índole expansionista se sustentará num outro perfil de relações, não mais com uma diversidade de tipos étnicos terrestres, subordinados, mas, frente a uma diversidade de tipos raciais extraterrestres ou interplanetários? São questões para nossa imaginação.

Ao que indicam as narrativas, tais raças são dotadas de autonomia e superioridade tecnológica. Parecem estar sujeitas a relações de comando aparentemente verticalizadas. Um exemplo muito comum é o Comando Ashtar.

Fonte: Wikipédia – Ashtar sheran

Sobre esse comando diz o ufólogo Leonardo Martins no site do G1 do Rio Grande do Sul, numa publicação sob o título “Veja relatos de gaúchos que afirmam ter feito contato com extraterrestres”:
“As pessoas dizem que ele é um ser comandante de uma frota imensa de naves. Que ele teria carne e osso, seria uma entidade física mesmo. Eu conheço um grupo de contatados que dizem que Ashtar Sheram nem é um ser, é um posto de comando e que há vários Ashtar Sheram. Independente de haver ou não algo lá, o que a gente pode dizer, no mínimo, é que Ashtar Sheram é um produto do nosso tempo”, (…).

É interessante considerarmos como se desdobram as narrativas dos contatados com extraterrestres e como ufólogos e ufófilos, estudiosos destes temas já inseparáveis, UFO/Extraterrestre, se pensam e são pensados. Assim como, também é interessante considerarmos como os diversos grupos étnicos se pensaram e foram pensados no contexto terrestre das relações sociais. Afinal, foi esse pensamento sobre as diferenças que definiu as relações concretas que se seguiram. Ainda cometeremos erros na percepção e leitura de nossas relações históricas e também frente aos horizontes recentes destas novas relações. No entanto, só com o exercício deste pensar coletivo, alcançaremos o melhor de nós.

Referências:

CARDOSO DE OLIVEIRA, R. O índio e o mundo dos brancos, 2ª ed. São Paulo, Livraria Pioneira Editora, 1972.

MÉSZÁROS, I. Para além do capital: rumo a uma teoria da transição. São Paulo: Boitempo, 2011. p.1042

Sampaio, Plinio Arruda. (2000). Dilema e desafios postos para a sociedade brasileira. Estudos Avançados, 14(40), 64-76. https://dx.doi.org/10.1590/S0103-40142000000300008

Imagem destacada de Bárbara Coelho Oliveira

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